No mês da consciência negra é didático lembrar como o racismo foi uma prática justificada por vários filósofos iluministas. Se a Europa foi uma invenção do Renascimento, a herança clássica que então se reivindicava valorizava mais o hermetismo do Egito Antigo do que o retorno à Grécia Antiga.
Essa tendência esta presente na história da filosofia publicada postumamente (1647) pelo holandês Johannes Vossius que incluía uma investigação pelas filosofias bárbaras da África (egípcia, etíope e libanesa) e Ásia (caldeus, judeus, persas, indianos, fenícios, frígios) antes de tratar da filosofia na Europa (com trácia, druidas etc.).
Jacob Brucker em 1742 ampliou a lista de povos estudados em sua história da filosofia, falando dos etruscos, árabes e romanos antigos e de povos exóticos (chineses, japoneses, budistas e indígenas canadenses). No entanto, Brucker começou a esboçar o mito grego ao afirmar que Orfeu trouxe do Egito para a Grécia a mitologia e não a filosofia; sendo os gregos os inventores do método científico e Tales e Anaximandro os primeiros filósofos.
Já o historiador da filosofia alemão Dietrich Tiedmann, em 1791 foi o primeiro aparentemente a cravar que a filosofia começou na Grécia sem reconhecer predecessores em qualquer lugar. A construção da história da filosofia como uma tradução unificada que teria surgido na Grécia e seria herdada pelos europeus é parte da estruturação do discurso racista que pressupõe uma herança ariana. Resumindo: a história do milagre grego é inseparável da invenção do racismo científico.
(fonte BERNASCONI, Robert. Etnicidade, cultura e filosofia. Compêndio de Filosofia. 2ª ed. Trad. por Luiz Paulo Rouanet. São Paulo: Ed. Loyola, 2002.)