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O Jornalismo – e a Filosofia: entre a Aletheia e a Doxa

ensaio de Severino Elias Ngoenha

As questões que discutimos geralmente decorrem de pessoas, circunstâncias e eventos. Hoje, a maior preocupação crítica que a nossa nação enfrenta são as próximas eleições. Embora nos destaquemos (negativamente) em muitas áreas, como corrupção e desigualdade, também enfrentamos desafios como a violência militar e social. Uma minoria prospera enquanto a maioria luta para satisfazer as necessidades básicas.

Ao longo dos anos, enfrentámos guerras pela independência, conflitos civis e batalhas contínuas, particularmente no centro de Moçambique. Os últimos focos de conflitos geralmente coincidem com ciclos eleitorais, resultando não apenas em confrontos militares, mas também em sequestros e restrições à liberdade de expressão.

Na semana passada, o líder do MDM em Portugal (Movimento Democrático de Moçambique) alertou sobre uma potencial agitação pós-eleitoral. Venâncio Mondlane ecoou essas preocupações, alertando que Moçambique pode testemunhar manifestações semelhantes às vistas no Quénia se o processo eleitoral for comprometido. Esta ameaça iminente de violência lança uma sombra sobre as nossas aspirações pela paz.

O que precisamos urgentemente é de um processo eleitoral transparente semelhante ao da África do Sul — um processo livre de conflitos e respeitado por todos. No entanto, as últimas eleições foram marcadas por problemas e violência. A violência aqui não é apenas física; inclui a supressão da verdade e da voz do eleitorado. Sem revisões e reformas pós-eleitorais sinceras, corremos o risco de perpetuar ciclos de violência e descontentamento. Isso pode exacerbar os conflitos em curso em Cabo Delgado e intensificar as lutas diárias enfrentadas por muitos, minando o próprio cerne da nossa democracia.

Qual é o papel da filosofia nestes tempos críticos? Recentemente, a BBC conduziu uma pesquisa sobre o filósofo mais influente da história, produzindo resultados surpreendentes. Karl Marx emergiu como o vencedor inesperado, seguido por David Hume, Nietzsche, Heidegger e Platão. Apesar de estar em sétimo lugar, Platão continua profundamente relevante hoje, particularmente em discussões sobre direitos, liberdade de informação, resolução pacífica de conflitos e busca contínua de consensos.

Platão defendeu uma ênfase social na verdade por meio do diálogo, justiça e rigor intelectual, rejeitando o foco grego antigo na força e violência (paideia) e a manipulação sofista da palavra. Esta fundação filosófica continua pertinente no nosso contexto moderno.

Outro âmbito digno de menção é a hermenêutica — a arte da interpretação. Derivada de Hermes, o mensageiro grego dos deuses que uniu os mundos divino e humano por meio da linguagem, a hermenêutica encontra ressonância no jornalismo. Jornalistas agem como intérpretes modernos, traduzindo questões sociais complexas para consumo e compreensão pública.

A democracia representativa necessita desse papel interpretativo, pois os cidadãos dependem de jornalistas para transmitir complexidades legislativas e preocupações públicas aos tomadores de decisão. Jornalistas facilitam o discurso democrático, garantindo que a governança permaneça transparente e acessível.

O dever de um jornalista estende-se além da mera interpretação; abrange fidelidade à verdade — aletheia. Eles não apenas transmitem opiniões (doxa), mas servem como guardiões da verdade em uma sociedade democrática. Essa busca pela verdade alinha-se aos ideais de justiça e transparência na governança de Platão.

Os jornalistas, portanto, personificam o quarto poder, agindo como um elo crucial entre a governança e os governados. O seu papel em promover o debate informado e manter a transparência é indispensável para uma sociedade coesa.

No entanto, o jornalismo enfrenta desafios formidáveis, particularmente pressões externas que distorcem a verdade para ganho político ou económico. Em países como o nosso, a propriedade da mídia influencia a independência editorial, moldando a percepção pública e comprometendo a integridade jornalística. A monopolização da mídia por interesses poderosos impede a transparência democrática, minando o papel do jornalismo como guardiãs do templo. O jornalismo investigativo surge como uma resposta crítica, arriscando muito para descobrir verdades ocultas por interesses adquiridos.

O papel do jornalismo na salvaguarda da democracia é primordial. À medida que Moçambique se aproxima de eleições cruciais, a necessidade de jornalismo responsável torna-se cada vez mais crítica para orientar o discurso público informado e garantir a integridade eleitoral. Defender a verdade em meio a pressões externas é essencial para promover uma sociedade democrática onde a governança é responsável e os cidadãos são empoderados.

Marcos Carvalho Lopes

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