Gonzalo Armijos Palácios (publicado originalmente no Jornal O Popular em 2015)
Quando as pessoas pensam sobre a punição adequada para aqueles que cometem crimes hediondos, com requintes de crueldade, consideram várias possibilidades. A primeira punição na qual pensam costuma ser a pena de morte. Alguns, inclusive, defendem a lei do talião. Uma das razões que leva as pessoas a considerar que a pena de morte não é uma pena adequada é pensar quem cometeu um crime como esses não recebe a punição suficiente pelo que fez. Pois seu sofrimento acaba com a execução. Isso leva alguns a refletir sobre a cadeia perpétua. E, em casos especiais, o isolamento completo do réu, a solitária, como comumente se conhece esse tipo de castigo. Não é segredo para ninguém que quem é submetido a um isolamento absoluto não consegue manter sua sanidade mental por muito tempo. Há casos, alguns famosos, em que os indivíduos ficam décadas na solitária, como ocorreu com Herman Wallace, um ex-integrante dos Panteras Negras, que ficou 41 anos na solitária, confinado em um espaço de menos de seis metros quadrados. Três dias depois de ser liberado por ordem de um juiz federal que declarou que seu julgamento foi inconstitucional, Herman Wallace faleceu. Como escrevi num artigo faz vários anos, quando os detentos perdem sua sanidade mental, o Estado termina castigando alguém por um crime que nem sabe que cometeu. Ou, dito de outra forma, termina castigando um pelo crime cometido por outro — aquele que o interno era antes de ser condenado à solitária e tinha plena consciência do motivo do castigo. O fato é que ninguém é condenado pelo Estado à solitária por este ou aquele crime. A solitária não é um castigo previsto em lei. O isolamento total é um castigo determinado pelas direções dos presídios a presos que elas consideram extremamente violentos, a membros de gangues ou a quem matou outro prisioneiro ou algum guarda. Este fenômeno é comum nos Estados Unidos que, apesar de representarem o 5% da população mundial, mantêm nas suas prisões o 25% dos detentos do mundo inteiro. Calcula-se que esse país mantém 81 mil prisioneiros na solitária. O grave é que muitos deles não foram condenados a cadeia perpétua — como talvez muitos, como eu mesmo, poderiam pensar. Isso significa que, por exemplo, em casos de estupradores seriais, condenados apenas a alguns anos, eles podem voltar às ruas depois de passarem anos na solitária e terem sido mentalmente afetados por isso. Outra situação paradoxal — e de qualquer ponto de vista esdrúxula e incompreensível — é que milhares de detentos não estão na solitária por terem cometido crimes graves, hediondos nem muito menos. Muitos estão aí por motivos fúteis, por razões políticas ou mesmo pelo racismo das autoridades prisionais que têm autonomia para impor “medidas disciplinares” que dependem unicamente de sua discrição. De modo que o Estado prende um indivíduo, o põe na solitária por anos, o transforma num ser sem autocontrole ou equilíbrio mental, provoca nele profundos ressentimentos e depois o libera para que todo o ódio acumulado e os transtornos sofridos por ele sejam direcionados contra qualquer um, seja ancião, jovem ou criança. Do anterior resulta, então, que o Estado recebe uma pessoa e, em lugar de pensar na sua reabilitação, o castiga de tal forma que o torna pior do que entrou para liberar depois um indivíduo mais violento e com um desejo de vingança que seguramente não tinha quando entrou na prisão. Pois é, esses são alguns dos paradoxos das políticas carcerárias e suas práticas perversas, não só contra os detentos, mas contra a própria sociedade. Gonzalo Armijos Palácios (publicado originalmente no Jornal O Popular em Janeiro de 2015) José Gonzalo Armijos Palacios - Possui graduação e doutorado em Filosofia pela Pontificia Universidad Católica Del Ecuador (1978 e 1982, respectivamente) e doutorado em Filosofia pela Indiana University (1989). Realizaou estudos de pós-doutorado na Indiana University em 1996 e 1997. Desde1992 é professor titular da Universidade Federal de Goiás.