Gosto de ler quem escreve bem. E esse “gosto” e mesmo a definição de “escrever bem” tem muito a ver com leitura e lembrança de leituras: na série Para Gostar de Ler, gostava do Drummond, do Sabino e do Luiz Fernando Veríssimo… Paulo Mendes Campos não. Estes nomes começavam a brilhar como autores legais e eu vasculhava os livros didáticos em busca de poemas, contos etc. O prazer de ler é que me fez reparar nos livros de Joel Rufino dos Santos. Nas aulas de história, o livro didático adotado era de uma historiadora local, goiana e tec. e tal… mas o livro não era bom de ler, nem tinha figuras, nem era didático. Era chato. Acho que a minha professora de História sabia, mas… era uma historiadora goina, livro feito em Goiás. Eu não gostava… e procurava outras leituras. E foi aí que encontrei os livros do Joel Rufino dos Santos na biblioteca. Lia e gostava. Eram livros novos e interessantes, com ilustrações, com desenhos que pareciam quadrinhos. Estava na 7a série no Colégio Estadual Dante Mosconi. 1992. Acho que fiz um trabalho dialogando com ele a professora se surpreendeu… tinha uma empolgação e eu não sabia o motivo. Acho que porque ele falava de coisas que ninguém falava, de um modo que ninguém escrevia…
Quando começei a trabalhar na Universidade da Integração Internacional da Lusofonia Afro-brasileira a filosofia africana tomou um lugar privilegiado nos meus estudos. Precisava e preciso estudar mais sobre os países africanos, sobre história da África, línguas, como se recontextualizaram no Brasil etc. Nesta busca de fontes e bibliografia o nome de Joel Rufino dos Santos reapareceu. Resolvi ir atrás.
Até porque, algumas questões que precisam ser pensadas não esperam o reconhecimento acadêmico de sua condição “filosófica”. Quando não são reconhecidas, continuam sendo pensadas fora da parte da academia que chamam de “faculdade de filosofia”. Muitas vezes, pessoas com formação em filosofia precisam seguir outros caminhos acadêmicos para pensar, para seguir questões que são necessárias neste aqui. No Brasil, as questões de gênero, educacionais, que envolvem desenvolvimentos tecnológicos contemporaneos tendem a ser pensadas fora da academia de filosofia. No caso de questões raciais o silêncio é muito relevante e marca de nossa evasão: como pensar o Brasil sem considerar que essa sociedade foi fundada no massacre dos índigenas e no escravismo? Como compreender nossa desigualadade persistente e imensa sem pensar esta herança autoritária? Se a filosofia acadêmica se esquivou da questão, isso não significa que não foi pensada. Quem quer pensar a Filosofia Brasileira, deve historicizar suas posições e buscar pensar uma genealogia dos problemas que enfrentamos hoje. Joel Rufino dos Santos fez isso.
Sua palestra sobre o encontro com Outro no Café filosófico é muito interessante. Daí encomendei livros: Saber do Negro e A questão do Negro na sala de aula são guias para pesquisa, que, apesar da internet tem muito valor. O livro Épuras do social. Como podem os intelectuais trabalhar para os pobres precisa ser lido… me empolguei e pensei… e aquele livro que li na 7a série, será que acho? Joel sempre falava que a história havia sido escrita por brancos, como seria a diferença de abordagem dele em seus trabalhos?
Quando fui professor de História no CEFET (que funciona no mesmo prédio que o Dante Mosconi), entre 2000-2002, ganhei um desses livros do Joel. Adorava. Emprestei para um estudante. Hoje acho que ele é formado em História. Nunca devolveu o livro. Pois bem… na busca nos livros usados encontrei o livro das minhas lembranças, comprei…. e que surpresa! Joel Rufino dos Santos nos livros didáticos de 1992 propunha uma abordagem para contar a História que reapensava o lugar do Egito, das civilizações e culturas negras.
Na minha memória o livro de Joel Rufino dos Santos era uma espécie de volume único paradidático para 7a série. Mas não: em 1992 a FTD lançou os quatro volumes de quinta a oitavo ano. O exemplar que eu cheguei a ter era o da oitava série. Este que consegui agora estava esquecido… e parece que por muita gente! Tem se tornado um projeto brasileiro este negligenciar os passos dados pelas gerações anteriores para refundar e recomeçar todas as coisas… essa tentativa de aumentar a importância e o heroísmo daquilo que se faz hoje é uma cegueira que tem dado seus próprios resultados. Joel Rufino dos Santos tem muito para nos ensinar… seu livro didático recuperava a História da África Antiga, colocando o Egito como matriz tanto da civilização grega quanto dos impérios africanos (de Ghana, Mali, Cuxe). Bem escrito e pensado, seu trabalho faz pensar e conecta o estudo das civilizações africanas com a formação da cultura brasileira, desvelando a herança da cultura negra. Ele escreve bem e faz pensar…
Marcos, sou leitor do professor Rufino, grande fã e o escolhi como caso de estudo para minha tese. Achei muito legal essa noção de história da Africa, conectada com a história europeia. Encontramos isso de maneira esparsa em alguns livros eruditos ou acadêmicos, porém não de maneira unificada e numa linguagem simples como parece ser a desse livro didático. Estou doido procurando-o mas é algo difícil de encontrar, há muitos anos fora de catálogo. Não sei se haveria algum meio de você me ajudar a achá-lo, nem que seja em forma de xerox. Posso pedir sua ajuda? Obrigado